A clínica médica, nasceu na Ilha de Kós, na Grécia, com Hipócrates, há 2.500 anos. Hipócrates introduziu a anamnese como etapa inicial do atendimento médico, além disso, nasceu-se a observação clínica, dando total importância para a história da doença e o exame físico em seus menores detalhes, como pilares para a elaboração do diagnóstico e do prognóstico do paciente. Sobre a etimologia da palavra, clínica vem do grego kline, leito, cama e médico se diziam klinikós, ou seja, o médico que atendia os doentes acamados.
Foi a escola hipocrática que revolucionou a medicina mágica na medicina racional dos dias de hoje. Segundo escreveu Hipócrates:
‘’É necessário começar pelas coisas mais importantes e aquelas facilmente reconhecíveis. É necessário estudar tudo aquilo que se pode ver, sentir e ouvir. O médico deve examinar cuidadosamente o corpo do paciente e perguntar a respeito das evacuações: estudar respiração, o suor, a atitude do paciente e a urina’’.
Na época, a temperatura corporal era aferida colocando a mão sobre o peito do paciente, e o exame físico, apesar de não ter o desenvolvimento da técnica, já incluía inspeção, palpação e ausculta.
Em Roma, no século I d.C, a estrela da medicina foi Galeno, que contribuiu para o progresso dos conhecimentos em anatomia e fisiologia, porém no quesito clínica médica, pouco acrescentou. Quando a Europa adentrou no obscurantismo, os grandes centros de conhecimento médico migraram para o oriente, primeiro para o Império Bizantino e logo depois para a Pérsia e os países árabes. Foi na Pérsia, em Ispahan, que surgiu um grande contribuidor para a clínica médica: Abu al Hussein ibn Abdallah in Sina, conhecido por Avicena.
Avicena viveu de 980 a 1037 d.C e era dotado de grande inteligência, se fosse nos dias atuais, seria conhecido como ‘’prodígio’’. Sua obra de maior peso na medicina é chamada de Canon, composta de 5 volumes e com inúmeras histórias clínicas. Descreveu doenças como hidrofobia, nefrite crônica, hidrocele, estenose pilórica, foi ele quem separou a paralisia facial em central e periférica e distinguiu os três tipos de icterícia: obstrutiva, hepática e hemolítica.
No século XVII houve um novo impulso no conhecimento da clínica médica: Thomas Sydenham, na Inglaterra, e Herman Boerhaave, na Holanda foram os nomes que trouxeram novidades. Sydenham foi conhecido como ‘’Hipócrates inglês’’, dizia que a medicina só pode ser aprendida à beira do leito do enfermo e que os sintomas devem ser minuciosamente observados e detalhados.
Boerhaave se destacou por ser professor de medicina com maestria na Holanda. Em seus ensinamentos ele se utilizou de uma enfermaria com 12 leitos, 6 ocupados por homens e 6 por mulheres, e de um anfiteatro para suas aulas expositivas. Foi ele o primeiro a utilizar o termômetro de mercúrio para medir a temperatura dos pacientes e uma lente para examinar as fezes. Os termômetros da época mediam cerca de 20-30 cm e demoraram 20 minutos para aferir a temperatura. Ele descreveu a rotura espontânea do esôfago, doença que recebeu seu nome: Síndrome de Boerhaave. O médico deixou 3 obras importantes intituladas: Aforismos, Instituições Médicas e Introdução à prática médica. No livro Introdução à prática médica, Boerhaave descreveu seu método pedagógico que é utilizado até os dias de hoje:
- Apresentação do enfermo
- Antecedentes remotos e recentes
- Início da enfermidade
- Estado atual do enfermo
- Hipóteses diagnósticas
- Evolução
- Em caso de óbito, necrópsia
- Correlação anatomoclínica
No século XVIII, o médico austríaco Leopold Auenbrugger introduziu a percussão do tórax no exame físico. Em sua infância, Auenbrugger via por muitas vezes, seu pai percutir um tonel para saber em que nível se encontrava o vinho no interior. Utilizando-se do mesmo método, foi possível realizar diagnóstico de derrame pleural e outras afecções pulmonares.
O século XIX foi o século em que a Clínica Médica teve seu período áureo. A instrumentalização do médico ocorreu em 1816, por Laennec, com a invenção do estetoscópio, que tornou-se símbolo do médico clínico. Antes dessa descoberta, a ausculta do coração e do pulmão era feita com o ouvido encostado no tórax do paciente, era dificilmente realizado em pessoas obesas e trazia constrangimento quando se tratava de pacientes mulheres. Foi examinando uma senhora obesa que Laennec teve a ideia de enrolar uma cartolina e colocar uma extremidade do precórdio da paciente e a outra ouvir, com nitidez as bulhas cardíacas.
Posteriormente ele substituiu a cartolina por um tubo de madeira e deu o nome de estetoscópio, que significa stethos, peito e skopein, examinar. Em 1819, ele publicou seu livro intitulado Tratado de auscultação mediata e das doenças dos pulmões e do coração, onde descreveu toda a semiologia do tórax em diferentes doenças.
Até então, a maleta do clínico era composta de termômetro, estetoscópio, e no final do século XIX adicionou-se o aparelho de medir pressão arterial. Em 1880, na Alemanha, o médico Von Basch fez um invento que consistia em uma bola de borracha cheia de água, ligada a uma coluna de mercúrio ou a um manômetro. Quando comprimia a bola de borracha sobre a artéria até o desaparecimento do pulso, obtinha o valor da pressão sistólica. Posteriormente, na Itália em 1895, o médico Riva Rocci substituiu a bola e borracha pelo manguito que é usado atualmente.
Em 1905, um médico russo, Nikolai Korotkov, descobriu que auscultando-se a artéria com o estetoscópio abaixo do nível de compressão, era possível determinar tanto a pressão sistólica quanto a diastólica. Outros dispositivos que incorporaram a maleta do clínico foram: abaixador de língua, lanterna, martelo de reflexo, oftalmoscópio, rinoscópio e otoscópio.
O estudo das doenças evoluiu para a correlação dos dados clínicos com as lesões dos órgãos, como as alterações de suas funções e com prováveis causas das enfermidades. Ao final do século XIX, William Osler teve uma grande contribuição para a Clínica Médica. O canadense foi um professor fundador do Hospital John Hopkins, em Baltimore – Estados Unidos. Ele quem nos trouxe a famosa frase:
‘’A medicina deve começar com o doente, continuar com o doente e terminar com o doente.’’
Ele redigiu o livro Príncipios e Prática da Medicina, que serviu para o ensinamento médico de muitas gerações.
No Brasil tivemos nomes importantes para a Clínica Médica como Silva Lima, Torres Homem, Francisco de Castro, Miguel Couto, Miguel Pereira, Ulysses Paranhos, Almeida Prado, Waldemar Berardinelli, Anne Dias entre muitos outros. O primeiro livro de semiologia publicado no Brasil, foi em 1896, chamado Clínica Propedêutica, pelo autor Francisco de Castro.
Com o passar dos anos e o advento da tecnologia, a medicina entrou em uma nova era. A descoberta dos raio-X em 1895 pelo físico Wilhelm Roentgen foi um marco histórico. O uso dessa tecnologia a favor da medicina representou um salto de qualidade na evolução. Posteriormente descobriram-se outros exames de imagem como cintilografia, ultra-sonografia, tomografia computadorizada e ressonância magnética. Outro progresso muito importante foi o uso de endoscópios flexíveis e a videoendoscopia, que permitiu a cirurgia laparoscópica.
Com essas novas descobertas e aumento da complexidade de cada sistema, a medicina dividiu-se em numerosas especialidades. Hoje, existem 50 especialidades médicas, sendo 20 clínicas, 12 cirúrgicas, 7 clínico-cirúrgicas, 5 de preventiva e social, 3 dedicadas aos métodos de diagnósticos e 3 a métodos terapêuticos. O médico recém formado é dito generalista, já o clínico geral é necessário que ele faça uma pós graduação de 3 anos após terminar os 6 anos do curso de medicina.
A fragmentação da medicina em subespecializações trouxe um grande avanço técnico, porém distanciou o médico do paciente, a figura do clínico-geral busca resgatar essa relação, aquele médico que conversa com o paciente, que o examina por inteiro, que o trata como pessoa. O seu trabalho deve ser reconhecido como de importância fundamental na organização de qualquer sistema de saúde. O paciente passa por ele, e se houver necessidade, o médico clínico geral irá ou não encaminhar o paciente para um médico especialista.